terça-feira, 9 de setembro de 2008

Salvador?

(Parte V)

Salvador trabalha em seu escritório quando toca o telefone. Era Lucélia transferindo a ligação de Dr. Maciel.

- Alô?!
- Bom dia Salva... acabei de ouvir a fita.
- E aí? O que achou?
- Realmente, parece um caso típico de psicopatia. Esse é daqueles perigosos. Provavelmente não seja a primeira mulher a matar.
- Será Maciel? Acho que você está exagerando hein...
- Que nada... tem todos os traços de um assassino em série! Acho melhor você repassar o caso... é muito perigos..
- Pára Maciel... tá parecendo minha mãe... além do que, o cliente já pagou mais da metade dos honorários... nunca tive problemas com clientes. Olha marquei com sua secretária para hoje. Vou avisar meu cliente e ele vai comparecer.
- Tudo bem, você quem sabe. Faz só uma coisa por mim, verifique o histórico deste homem e cheque todas as informações que ele te passou.
- Vou checar e depois te passo as informações. Muito obrigado. Vou mantendo contato contigo.

Assim que desliga o telefone, interfona pedindo à Lucélia que traga a ficha de Francisco até sua sala.

Olhou todos os detalhes das informações, checou todos os registros e números de documentos e averiguou que tudo estava correto. Logo pensou que Maciel estivesse um pouco assustado com o relato – afinal de contas não era todo dia que um psiquiatra se depara com um psicopata, ainda por cima, assassino.

Ligou para Francisco e pediu que viesse imediatamente para seu escritório.

Após alguns minutos, Lucélia acompanha Francisco até a sala, Salvador já havia avisado que era para o mesmo entrar sem ser anunciado.

- Olá Francisco!
- Oi doutor, novidades?
- Sim. Fui até a delegacia e verifiquei se haviam iniciado o inquérito, mas somente constatei a ocorrência do desaparecimento de Rita. Inclusive, fui até o local do crime. Você tem sorte. Os urubus já estavam se encarregando de limpar todo o local.
- Sério doutor!?!
- Pois é. Mas há um porém. Com certeza o delegado irá te intimar a depor no inquérito.
- Por quê?
- Por causa das ligações e das mensagens no computador. A esta hora os policiais já devem estar colhendo o máximo de informações na casa de Rita.
- Entendi. E o que o senhor acha que eu devo falar?
- Calma. Primeiro gostaria que você conversasse com um amigo meu.
- Que amigo?
- Um amigo meu de longa data, que é psiquiatra.
- Ah doutor, acho melhor não.
- Calma Francisco, eu preciso que você converse com ele, pois dependendo do que ocorrer futuramente, caso você seja indiciado, ele pode nos ajudar efetuando alguns laudos clínicos.
- Mesmo assim doutor, eu não gostaria. Eu não gosto muito de psicólogos, psiquiatras...
- Eu preciso que você entenda que é de extrema importância você se consultar. Confie em mim. Eu sei o que estou fazendo.
- Tudo bem. Não é a toa que o senhor está onde está hoje né.
- Que bom que você entendeu. Só que tem uma coisa. Preciso que você conte tudo. Ele já está sabendo de antemão o que aconteceu, mas fique tranqüilo que é de minha inteira confiança.
- Ok.

Salvador passa o endereço do consultório e a hora da consulta. Despede-se de Francisco e retorna aos demais casos.


*** CONTINUA ***

Salvador?

(Parte IV)

- Alô?!? Maciel?
- Sim... Dr. Salvador?
- Ele mesmo... como está meu nobre amigo Dr. Maciel?
- Na correria de sempre meu caro... mas me diga, a que devo a honra de sua ligação?
- Dúvidas meu amigo, algumas dúvidas... só que por telefone fica um pouco difícil... que tal a gente jantar hoje no Vino! ?
- Você quem sabe meu amigo... que horas?
- Oito e meia tá bom pra você?
- Fechado... te encontro lá...
- Abraços!

Desligando o celular, pegou o telefone e avisou Lucélia que estaria saindo e que voltaria ao escritório somente amanhã.

Pegou o gravador e sua pasta, fechou a porta de sua sala e foi direto ao elevador. Eram cinco da tarde, conferiu os bolsos para ver se não estava esquecendo de mais nada, entrou no elevador e apertou o subsolo. Entrou em seu BMW e rumou para a delegacia.

- Boa tarde!
- Boa tarde Dr. Salvador, a que devemos a honra?
- Então Sérgio, vim dar uma olhada naquele inquérito de furto seguido de morte...
- Do Anselmo da Cruz?
- Esse mesmo...
- O delegado ainda não finalizou as diligências...
- Será que ele vai demorar?
- O senhor sabe como é... um dia falta viatura, outro dia falta a gasolina e assim vai...
- Pois é (risos)... bom, fazer o que né... mas e o resto? Tudo em ordem? Alguma ocorrência interessante?
- Ultimamente somente os homicídios da Bratac mesmo...
- E o delegado? Muito ocupado?
- O Dr. Epaminondas ta colhendo uns depoimentos... não é nada demais não... ontem vieram registrar a queixa de um desaparecimento de uma mulher... mas nada de interessante...
- Desaparecida há muito tempo?
- Que nada... desapareceu ontem... coisa recente...
- E você sabe qual o motivo?
- Olha parece que ela saiu com um rapaz e não voltou mais...
- Ah é? Muito estranho hein...
- Bom, como ainda está recente, o delegado está com algumas cautelas...
- Está certo... bom, está na minha hora... até mais Sérgio...
- Até!

Entrou no carro, andou duas quadras, estacionou e pegou o celular novamente. Colocou no modo restrito e ligou para o 10º Distrito.

- Alô?
- 10ª, pois não?
- Oi, eu queria noticiar uma ocorrência de desaparecimento...
- Senhor, é necessário vir até a delegacia, por telefone não dá não...
- Ah é? Me desculpe, eu não sabia... tem como me dar uma informação então?
- Claro...
- Foi registrado algum desaparecimento de Rita de Cássia Moreira?
- Olha... meu senhor me desculpe... só pelo nome assim fica impossível...
- Por favor... é que estou no trabalho... liguei na casa dela e ninguém atendeu... ela trabalha comigo e a gente está preocupado... ela nunca falta... liguei até para a mãe dela, que estava desesperada porque ela não tinha ido receber as filhas em casa... e...
- Tudo bem, vou quebrar seu galho... deixa eu ver... um minuto...

[ ]

- Pronto...tá aqui... noticiado o desaparecimento de Rita de Cássia Moreira às 18h00min do dia 25 de janeiro...
- Muito obrigado... vou aparecer por aí mais tarde para ajudar...
- Tá ok... tenha uma boa tarde.

Já que tinha a certeza de que tinham dado falta da vítima, o próximo passo seria ir ao local do crime verificar alguns vestígios que poderiam denunciar seu cliente.

Chegando ao Patrimônio Espírito Santo, deu algumas voltas, procurou alguns milharais, mas não havia como encontrar o local do crime, pois havia plantação tanto de um lado da estrada quanto de outro.

Assim, quase desistindo, deu meia-volta com seu carro, porém, avistou alguns urubus voando em círculo. Não teve dúvida, rumou para o local. Chegando, avistou o carreador com marcas de pneus grandes. Parou o carro em um carreador que estava próximo, desceu e seguiu a trilha dos pneus. Quanto mais andava, mais sentia um cheiro forte de carne podre. Sabia que estava no caminho correto. Andou mais alguns minutos e avistou alguns urubus em cima de algo. Olhou bem, se aproximou mais um pouco, o pouco que os urubus deixavam, tinha certeza que iria encontrar o corpo de Rita.

Quando conseguiu visualizar o corpo, não acreditou, era a carcaça de um boi velho em decomposição. Não acreditou, deu risada de si mesmo. Acabou voltando para o carro. Só que ao se aproximar da porta não havia reparado em algumas pegadas na terra vermelha e um sapato vermelho mais a frente.

Logo pensou que tinha entrado no carreador errado. E tinha mesmo. Andou mais um pouco achou o outro par do sapato. Novamente sentiu o cheiro de carniça, sem, no entanto, avistar algum urubu. De repente viu uma clareira no meio do milharal, os pés-de-milho haviam sido derrubados propositadamente para dar mais espaço. E lá estava o corpo nu de uma mulher. O corpo estava com aparência rija, com a pele um pouco escura. Estava em estado inicial de decomposição. Tentou se aproximar, mas o seu estômago e um dos urubus, que havia acabado de pousar, o impediram. Pôde verificar então o quão cruel Francisco tinha sido com a moça. Realmente, o estado em que se encontrava o corpo só tinha vista nos livros de medicina legal.

No entanto, não se deixou levar pela emoção. Um bom advogado não se leva pela emoção. Repetia sempre essa frase para si mesmo. Tratou de olhar em volta, verificar alguma pista que seu cliente poderia ter deixado, mas não encontrou nada que pudesse incriminá-lo.

Olhou mais uma vez para ver se encontrava alguma casa ou cabana, mas nada encontrou.

Tratou de sair o mais rápido possível do local. Enquanto isso, os urubus iam se acomodando em volta do corpo de Rita e já ensaiavam algumas bicadas.

Entrou no seu carro, ligou o ar-condicionado. Parecia que aquele cheiro podre havia penetrado suas narinas. Chegou em casa, tomou um demorado banho, mas o cheiro persistia. Ligou para seu pai e pediu para que separasse um pouco de rapé.

Na casa de seus pais, cumprimentou sua mãe com o costumeiro beijo no rosto e aquele abraço apertado na irmã mais nova. Perguntou pelo seu pai, disseram que estava nos fundos, na dispensa.

- Oi pai...
- Filho!!! Você tem que visitar mais a gente... sua mãe e eu estamos ficando velhos... e você sabe um dia...
- Pai... cala a boca ok? (risos) Não diga mais isso...
- O tempo voa meu filho... um dia ela bate à nossa porta...
- Tá pai... outra hora a gente conversa disso...o senhor separou o rapé?
- Toma meu querido... que aconteceu? Tá resfriado?
- Não, fui no IML e o cheiro de um cadáver não sai do meu nariz...
- Nossa, já disse prá você mudar de ramo ... tem que parar de defender bandido...
- Pai, não vamos discutir mais uma vez... eu sei que o senhor é um apaixonado pelo direito civil... mas... é o que eu gosto... é o que sei fazer...
- Bom, você deve saber o que faz... afinal você sempre foi tão esforçado e estudioso...
- Tem jeito de ser diferente? O senhor me ensinou a ser assim, não basta ser bom, devemos ser o melhor!
- Isso mesmo, e eu estou vendo que você aprendeu a lição direitinho...
- Com um professor como o senhor...

A conversa foi interrompida com a mãe de Salvador convocando-o para jantar.

- Ah mãezinha obrigado, mas eu só vim pegar o rapé com o pai...
- Você tá resfriado meu amor?
- Não mãe... cheiro ruim no nariz mesmo...
- Vamos jantar com a gente vai... eu fiz aquele macarrão que você gosta...
- Não dá mesmo mãe... combinei com o Maciel de jantarmos juntos... assunto de trabalho...
- Meu filho, você está trabalhando demais...
- Mãezinha... não começa...
- Bom, fala que eu mandei um abraço pro Alfredinho... diga para ele aparecer... a gente gosta tanto desse menino... Ai... quando eu lembro de vocês crianças brincando aqui em casa, nem poderia imaginar os homens que se tornariam... os dois doutores... quanto orgulho...
- Pode deixar que eu falo com ele... agora tô quase atrasado.

Deu um abraço apertado no seu pai, um beijo em sua mãe e se dirigiu à porta. Antes de chegar, Miriam o interpela, pulando em seus braços.

- Mano, tô com saudade de você...
- Eu sei Mi.... eu também tenho muita saudade de você... prometo que irei aparecer com mais freqüência... o escritório tá numa correria... você sabe... mudança é um transtorno... mas, assim que tudo estiver ajeitado eu passo aqui mais vezes.
- Tenho uma coisa prá te dizer...
- Ah é? Mas, fala rapidinho que eu tenho que encontrar o Maciel...
- Eu vou fazer vestibular prá arquitetura...
- Nossa... mas e a faculdade de direito?!?!
- Você sabe que eu não levo o menor jeito...
- Mas no começo é assim mesmo... a gente nunca sabe se fez a escolha certa... bom, você tem 22 anos, já é uma moça e deve estar certa daquilo que quer! Acertei!?
- Uhum... (risos) e tenho outra novidade prá te contar também... eu to ficando com um cara...
- Ah não... isso não... (risos) quem é o malandro hein?? Vai ter que pedir benção para mim...
- Calma... a gente tá se conhecendo ainda... mas eu vou te apresentar logo logo...

Nisso, enquanto Salvador abre a porta de seu carro, verifica uma camionete prata com os vidros escurecidos. Percebeu que assim que sua irmã se aproximou de seu carro, o motorista da camionete deu a partida e passou devagar por eles.

- Vizinho novo?
- Não sei não...
- Mi... conheço essa sua cara...
- Não sei (risos) ... é sério...
- Bom, depois eu terei uma conversa séria com a senhorita, agora estou atrasado, o Maciel vai me encher o saco... Te amo viu...
- Também te amo.

Despediu-se da sua irmã com um efusivo abraço. Estava com muita saudade de todos e prometeu a si mesmo que, após encerrar o caso do Francisco, iria visitá-los mais vezes na semana.

Abriu o pote de rapé, colocou entre os dedos e inalou de uma só vez. Espirrou alto. Repetiu. Espirrou novamente. Pronto, o cheiro havia diminuído, já não incomodava tanto.

Chegando ao restaurante, Maciel já o esperava com uma certa impaciência.

- Você nunca perde essa velha mesmo hein Salva?
- Que velha?
- Essa velha mania de chegar atrasado... (risos)
- E você não perde essa velha também...
- Até parece... eu nunca chego atrasado...
- Eu estou falando da sua velha mania de fazer piada sem graça... (risos)
- Ha ha ha engraçadão... Vamos entrar que eu estou com o estômago nas costas.

Após efetuados os pedidos Salvador inicia o assunto.

- Maciel estou com uma dúvida em um novo caso.
- Não diga que você vai me pedir para atestar insanidade... o promotor já está desconfiando...
- Não, não, não. Esse é diferente, estou achando que meu cliente é um psicopata...
- Ih... complicado hein... o que te fez pensar isso?
- O relato do crime. A frieza com que ele descreveu o crime... é impossível não ser um psicopata...
- Calma Salva. Você gravou a consulta?
- Gravei sim, está no carro, depois te entrego. Você precisava ver o corpo...
- O pessoal da criminalística fez o laudo?
- Não. Eu achei o local do crime e o corpo estava em fase de decomposição, os urubus já estavam se preparando para o banquete...
- Rapaz, você se arriscou hein... Você não é detetive, é advogado...
- Eu sei, mas, eu precisava ver se tinha algum vestígio...
- Mesmo assim, você se arriscou. Se alguém te vê por lá... imagina o problema...
- Tá certo... mas você me conhece...
- É, imagino quando você ficar velho... se hoje é teimoso desse jeito, imagina daqui uns anos... (risos)
- Mas, voltando ao assunto, vou marcar uma hora para ele ir até seu consultório e você depois me dá um parecer ok?
- Tudo bem, ligue para minha secretária e agende... acredito que tenho uma hora vaga amanhã.
- Feito meu parceiro.

Os pedidos chegam, e a conversa fica mais amena, tratando apenas de assuntos corriqueiros e banais.

*** CONTINUA ***

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Salvador?

(Parte III)

Às catorze horas, Lucélia interfona na sala de Salvador e anuncia a chegada do Sr. Francisco. Prontamente manda-o entrar.

- Boa tarde Francisco, vejo que está bem melhor agora...
- Sim doutor, tive um sono tranqüilo, fui a um apart-hotel, simples, mas aconchegante...
- Certo, é bom que esteja disposto, pois iremos relatar todo o ocorrido agora. Posso começar? (perguntou pegando o gravador).
- Estou preparado doutor...

Rebobinou a fita até o ponto desejado e apertou o REC

- Em nossa última consulta Francisco, você havia dito que derrubou a moça no milharal, correto?
- Correto!
- E depois, o que aconteceu?
- Bom, depois que ela caiu no chão, ela abriu as pernas e me chamou passando a mão entre as pernas.
- E o que você fez?
- Eu deitei em cima dela e a gente começou a se esfregar de uma forma animalesca. Separei-me dela, e, enquanto tirava minha roupa ela tirava o vestido fazendo charme, rebolando, passando a mão pelo corpo de uma forma bem sensual. Assim que ficamos sem roupa, comecei a beijá-la nos seios apertando o seu corpo contra o meu... quando me veio uma vontade louca, incontrolável, de mordê-la...
- E você a mordeu?
- Mordi. Mordi os bicos dos seios, o pescoço, a orelha, as coxas...
- E o que ela lhe dizia?
- No começo ela estava gostando, depois ela começou a reclamar e pediu que eu parasse pois estava doendo muito...
- E o que você fez?
- Eu não conseguia parar...
- E ela fez o que?
- Bom, ela, chorava, gritava, tentava me afastar com as mãos, mas não conseguia, e isso me excitava mais ainda. Eu não estava mais conseguindo me controlar... me deu uma empolgação e...
- E o que aconteceu?
- Aconteceu que ela começou a arranhar meu rosto e minhas costas, me deu vários socos, mas como eu estava deitado em cima dela não adiantava muito, entende doutor?
- Sim, entendo.
- Como ela gritava muito, peguei minha meia, enrolei e enfiei na boca dela. Ela tentou morder meus dedos, mas não teve muito êxito porque com minha outra mão segurei o pescoço dela com força. Ela tentou de tudo pra afastar meu braço... mas não conseguiu e desmaiou...
- E depois que ela desmaiou?
- Resolvi amarrar as suas mãos e seus pés, com o próprio vestido dela sabe... rasguei em tiras...
- Por quê?
- Prá que ela não me arranhasse nem batesse mais...
- Sei... e ela chegou a acordar do desmaio?
- Acordou sim... acordou e começou a se mexer, debater, tentou levantar e não conseguiu.
- E o que você fez?
- Vendo ela naquela situação, fiquei com muito tesão. É como se um fogo me consumisse e eu não respondesse mais pelos meus atos... eu perco a consciência... você me compreende doutor?
- Compreendo...
- Então eu parti pra cima dela e coloquei-a de quatro, mesmo amarrada ela se mexia bastante... agarrei-a pelos cabelos e tentei penetrar... mas não consegui... é meio complicado eu ter ereção sabe doutor... eu sinto tesão mas...
- Mas você não fez sexo com ela então?
- Fiz... Eu transei sim...
- Sem penetração?
- Não senhor, com penetração...
- Como assim? Você acabou de dizer que não consegue ter ereção...
- Eu não conseguia ter ereção com ela se mexendo tanto...
- Então como você fez sexo com ela?
- Ela se mexia demais... então eu peguei meu cinto passei em volta do pescoço dela até ela não mexer mais... aí o corpo dela caiu de lado... foi quando eu consegui ficar tranqüilo e transar...
- Na verdade você a matou para poder transar?
- É, foi mais ou menos assim...
- E você gosta de fazer sexo com mulheres mortas?
- Olha doutor, a mulher de carne gelada é mais gostosa sabe... a carne fica mais dura... e o senhor saber... só fica com a carne dura depois de morta. Quando tem sangue também eu gosto... quando a mulher está menstruada eu prefiro...
- Entendi...

Estava um pouco tenso, já havia lidado com alguns assassinos, mas nenhum era tão frio ao ponto de relatar sem qualquer constrangimento e normalidade seus crimes.

- E posso te confessar mais uma coisa doutor?
- Claro que pode...
- Só assim que eu consigo gozar...

O silêncio imperou por alguns segundos, quando o celular de Francisco põe-se a tocar.


- Alô?! Sim, é ele mesmo... olha agora não posso falar, estou no meio de uma reunião ok? Já te retorno...

- Tem mais algum detalhe que você tenha esquecido de me contar Francisco? É muito importante relatar tudo, para que eu possa escolher a melhor defesa para seu caso...
- Os detalhes são esses mesmo ...
- Você chegou a levar o corpo para algum lugar?
- Não... eu deixei lá mesmo...
- Bom... volte para o seu apart-hotel... e não saia de lá até minha ordem ok?
- Ok.
- Qual o nome da moça?
- Rita de Cássia Moreira.
- Idade?
- Não sei... acho que tinha uns 30, 35...
- O que o Doutor acha?!
- Olha, vamos esperar o inquérito, verificar se você foi denunciado. Enquanto isso vou dar uma sondada na delegacia de homicídios para ver se registraram alguma ocorrência nessas últimas horas. Por hoje é só Francisco. Converse com a Lucélia, ela irá pegar seus dados, telefones, assim que tiver uma posição a respeito do seu caso, entro em contato com você. Caso ocorra algo, me ligue, não importa a hora ok?
- Feito Doutor!

Assim que Francisco saiu da sala, desligou o gravador, levantou-se, foi até a estante, abriu o frigobar, colocou uma dose de uísque no copo, engoliu de uma vez. Pensou em tudo que foi dito dentro de seu confessionário, no telefonema recebido no meio da conversa, nos detalhes sórdidos.

Olhou para a janela pegou o celular e...

*** CONTINUA ***

quinta-feira, 6 de março de 2008

Salvador?

(Parte II)

Respirou fundo, enquanto Salvador pegava o gravador, para não deixar escapar nenhum detalhe dos fatos que estavam para ser postos.

- Bom doutor, conheci a moça pela internet, num site de relacionamento, há duas semanas, hoje é dia vinte e cinco né, é, duas semanas completas... sabe aqueles bate-papos de internet??
- Sei...
- Então conheci essa moça, conversamos uns dias e resolvemos marcar de nos encontrar em frente ao Banco do Brasil no calçadão, porque ela era secretária de um escritório de advocacia no edifício que fica ali em cima do banco.
- E que dia ocorreu esse encontro?
- Dois dias depois que a gente se falou pela primeira vez, foi no dia... no dia... peraí...

Nisso, Francisco tirou o celular do bolso, parecia verificar algumas mensagens ou ligações.

- Tá aqui, dia treze de janeiro... é isso, conheci ela na internet dia onze, conversamos e dia treze nos encontramos ali na frente do banco... Eu marquei na agenda de compromissos do celular, para não esquecer...
- Certo, e vocês foram para onde, o que fizeram?
- A gente foi até o shopping Royal tomar um suco, conversamos um pouco mais, depois resolvemos encompridar a conversa e levei-a para jantar no Baby Buffalo, ali perto do colégio Mãe de Deus, o senhor conhece?
- Sim, conheço...
- Jantamos e a levei para casa, no meu carro... ela tinha um papo muito agradável sabe... era muito bonita também... aí deixei-a em casa, mas, nesse dia nada aconteceu, nem um beijo, nada, ela dizia que ainda era cedo para se envolver novamente com alguém, porque acabara de se separar, mas que tinha adorado me conhecer e que era para a gente continuar conversando.
- Certo, e o que você fez?
- Fiquei um pouco chateado, mas resolvi entendê-la, e acabei indo para casa sem um beijo de boa noite.
- Ok. E você continuou conversando com ela pela internet?
- Sim, conversava todo dia, agora por aquele programa, o msn sabe?
- Sei sim...
- Saímos mais algumas vezes na semana, fomos a alguns restaurantes. E hoje, logo de manhã ela me mandou uma mensagem no msn dizendo que queria me ver e que as crianças iriam ficar com o pai. Bom, quando fui encontrá-la na saída de seu trabalho, notei que ela estava mais diferente, mais “acesa”. Estava usando um vestido florido, na altura da coxa, e com um decote que ressaltava seus belos seios. Então, logo que ela entrou no carro, me agarrou, ao invés de me abraçar, e me beijou de uma forma louca e desesperada, começou a passar a mão pela minha coxa, apertando forte, dizendo que estava louca por mim. Decidir ligar o carro e dar umas voltas com ela, porque ainda era cedo, e o senhor sabe né, ficar dando amassos no carro chama muita atenção. Então, atravessei o centro inteiro, enquanto ela me beijava o pescoço e apertava minha coxa, e dizia ao pé de meu ouvido que queria ir para um lugar bem tranqüilo. Acabei indo até o Patrimônio Espírito Santo, e parei o carro em um carreador, numa plantação de milho. Olhei bem, e não tinha ninguém à minha volta. Nisso, a mulher começou a enfiar a mão por dentro da minha calça e a me beijar com mais vontade ainda. Bom, falei prá ela que tinha muito tesão em transar em um milharal...
Ela, tirou a mão de dentro da minha calça, me olhou e abrindo a porta do carro disse para eu pegá-la. Assim, começou a correr no meio do milharal. Saí do carro e corri atrás dela até alcançá-la, e, quando a alcancei derrubei-a no chão...

Nisso, o sujeito parou de falar e começou a respirar de forma ofegante. O que causou-lhe um certo receio, pois parecia que o homem estaria entrando em desespero, tendo um ataque, uma crise de asma.

- Francisco? Você está bem? Francisco? Procure se acalmar, aqui dentro é seguro.
- Desculpe doutor, mas é que quando começo a lembrar, me chega a dar um calor, uma coisa louca, tenho a sensação de que vou perder a consciência.
- Bom, se o senhor quiser continuar a falar amanhã...
- É acho melhor terminar amanhã...
- Alguém viu o senhor no milharal?
- Não... acho que não. Quando entrei no carro e vim embora não havia ninguém ali, pelo menos eu não vi ninguém.
- Ok. O primeiro passo é você não ser preso em flagrante, pois você não tem certeza se alguém te viu, assim, ligue para sua mãe dando alguma desculpa que não passará a noite em sua casa.
- Pode deixar, doutor.
- Você tem outra roupa? Porque com essas que está vestindo despertaria muitas suspeitas, e isso não é bom. Ela está ensangüentada não está?
- Tenho outra roupa sim doutor, na verdade essa é minha roupa de ginástica, minha roupa de trabalho está dentro de minha mochila no carro. É sangue da mulher isso aqui...
- Perfeito, vá buscar sua mochila e troque-se aqui no banheiro. Depois, pegue essa roupa ensangüentada e queime-a em algum lugar afastado. Entendido?
- Sim senhor, já volto.

Desligou o gravador e enquanto o sujeito ia buscar sua mochila, ficou pensando no que poderia ter acontecido para que ele cometesse um crime. Achou muito estranha a sua reação no momento em que iria contar sobre o ato sexual e sobre o crime. Nisto, já começou a esboçar uma linha de defesa em sua cabeça.

- Bom doutor, estou pronto para partir...
- Muito bem, esteja aqui em meu escritório, amanhã às duas horas da tarde que terminaremos a consulta.
- Amanhã às duas. Muito obrigado doutor, muito obrigado mesmo...
- Até amanhã então...

E assim partiu o sujeito, agora mais calmo e mais arrumado.


*** CONTINUA ***

terça-feira, 4 de março de 2008

Salvador?

(Parte I)

Estava terminando mais uma petição a todo vapor em seu notebook, trabalhava incessantemente, quando bate à porta de seu escritório um sujeito esbaforido, descabelado, com alguns arranhões no rosto e algumas manchas vermelhas na camiseta amarela, que estava bem esgarçada.

- Pois não?!?!?
- O senhor é o Doutor Salvador?
- Sim, em que posso ajudá-lo?
- Por obséquio, poderia primeiramente me oferecer um copo d´água, pois estou exausto como o senhor mesmo pode reparar, e, necessito, urgentemente contratar os seus serviços.
- O copo d´água posso trazer, mas, me desculpe, não estou atendendo a esta hora, o escritório já fechou, apenas estou terminando um último trabalho e já estou indo para casa e...
- Doutor, necessito muito de sua ajuda, estou desesperado... muito desesperado, é um caso urgente... por favor não tenho como recorrer a mais ninguém senão o senhor!!!

Pensou um pouco, viu que o homem estava realmente desesperado, algo lhe dizia que deveria ouvir a história que teria para contar...

- Bom, um minuto que vou pegar a chave ok...

Dirigiu-se mesa, apanhou a chave, abriu a porta, levou o sujeito até sua sala pediu para que se sentasse, enquanto iria buscar o copo d´água.
Não estava acostumado a fazer isso para seus clientes, porque quem o fazia era Lucélia, sua secretária, mas, como já se passava da meia da noite, assim o fez, com um pouco de receio, uma vez que nunca tinha visto o sujeito na vida.
Entregou o copo ao homem que o bebeu como se tivesse acabado de chegar do Saara.

- Pois não senhor, em que posso ser útil?
- Doutor, acabo de cometer uma grande besteira... o senhor é criminalista né?
- Sim, advogado especializado na área criminal... Que besteira o senhor andou fazendo?

- Acabei de matar uma moça... foi... foi um ato impensado, eu... eu não queria, mas...ela me obrigou...olha o meu rosto doutor, foi ela quem fez isso (apontava o homem para todos os arranhões, quando começava a se exaltar)...
- Acalme-se por favor, aqui o senhor está em segurança. Vou-lhe trazer mais um copo d´água e fazer algumas perguntas, ok?
- Sim doutor, tudo bem.

Estava acostumado a lidar com criminosos e assassinos desde a época de faculdade (no escritório de prática jurídica da universidade) onde selecionava apenas as causas penais para estudar e defender. Achava o máximo esmiuçar a legislação em busca de brechas e falhas que pudessem ajudar seus clientes. Não só os colegas de classe, como seus professores, reconheciam-no como o melhor aluno de direito penal da faculdade.

Mais uma vez retornou com o copo e entregou ao homem.

- Primeiro, gostaria de saber seu nome...
- É Francisco da Costa Estrella...
- Bom, Francisco, quantos anos o senhor tem? É casado? Solteiro? Trabalha?

- Doutor, tenho 30 anos, sou solteiro, moro com a minha mãe, sou formado em engenharia civil e trabalho para algumas construtoras daqui da cidade, e algumas de outros estados... Doutor não se preocupe com dinheiro, tenho o suficiente e alguns bens também... eu quero contratar o senhor, porque sei que é o melhor na área...
- Calma Francisco, conversamos sobre os honorários depois, agora preciso saber o que me traz o senhor aqui... certo?
- Certo...
- Gostaria que o senhor me contasse como tudo aconteceu. O que o senhor estava fazendo; onde ocorreu o crime; quem era a moça; se o senhor a conhecia; de que forma o senhor a matou, entendeu? Preciso saber de todos os fatos pormenorizadamente.
- Entendi sim... bom...

*** CONTINUA ***