quinta-feira, 6 de março de 2008

Salvador?

(Parte II)

Respirou fundo, enquanto Salvador pegava o gravador, para não deixar escapar nenhum detalhe dos fatos que estavam para ser postos.

- Bom doutor, conheci a moça pela internet, num site de relacionamento, há duas semanas, hoje é dia vinte e cinco né, é, duas semanas completas... sabe aqueles bate-papos de internet??
- Sei...
- Então conheci essa moça, conversamos uns dias e resolvemos marcar de nos encontrar em frente ao Banco do Brasil no calçadão, porque ela era secretária de um escritório de advocacia no edifício que fica ali em cima do banco.
- E que dia ocorreu esse encontro?
- Dois dias depois que a gente se falou pela primeira vez, foi no dia... no dia... peraí...

Nisso, Francisco tirou o celular do bolso, parecia verificar algumas mensagens ou ligações.

- Tá aqui, dia treze de janeiro... é isso, conheci ela na internet dia onze, conversamos e dia treze nos encontramos ali na frente do banco... Eu marquei na agenda de compromissos do celular, para não esquecer...
- Certo, e vocês foram para onde, o que fizeram?
- A gente foi até o shopping Royal tomar um suco, conversamos um pouco mais, depois resolvemos encompridar a conversa e levei-a para jantar no Baby Buffalo, ali perto do colégio Mãe de Deus, o senhor conhece?
- Sim, conheço...
- Jantamos e a levei para casa, no meu carro... ela tinha um papo muito agradável sabe... era muito bonita também... aí deixei-a em casa, mas, nesse dia nada aconteceu, nem um beijo, nada, ela dizia que ainda era cedo para se envolver novamente com alguém, porque acabara de se separar, mas que tinha adorado me conhecer e que era para a gente continuar conversando.
- Certo, e o que você fez?
- Fiquei um pouco chateado, mas resolvi entendê-la, e acabei indo para casa sem um beijo de boa noite.
- Ok. E você continuou conversando com ela pela internet?
- Sim, conversava todo dia, agora por aquele programa, o msn sabe?
- Sei sim...
- Saímos mais algumas vezes na semana, fomos a alguns restaurantes. E hoje, logo de manhã ela me mandou uma mensagem no msn dizendo que queria me ver e que as crianças iriam ficar com o pai. Bom, quando fui encontrá-la na saída de seu trabalho, notei que ela estava mais diferente, mais “acesa”. Estava usando um vestido florido, na altura da coxa, e com um decote que ressaltava seus belos seios. Então, logo que ela entrou no carro, me agarrou, ao invés de me abraçar, e me beijou de uma forma louca e desesperada, começou a passar a mão pela minha coxa, apertando forte, dizendo que estava louca por mim. Decidir ligar o carro e dar umas voltas com ela, porque ainda era cedo, e o senhor sabe né, ficar dando amassos no carro chama muita atenção. Então, atravessei o centro inteiro, enquanto ela me beijava o pescoço e apertava minha coxa, e dizia ao pé de meu ouvido que queria ir para um lugar bem tranqüilo. Acabei indo até o Patrimônio Espírito Santo, e parei o carro em um carreador, numa plantação de milho. Olhei bem, e não tinha ninguém à minha volta. Nisso, a mulher começou a enfiar a mão por dentro da minha calça e a me beijar com mais vontade ainda. Bom, falei prá ela que tinha muito tesão em transar em um milharal...
Ela, tirou a mão de dentro da minha calça, me olhou e abrindo a porta do carro disse para eu pegá-la. Assim, começou a correr no meio do milharal. Saí do carro e corri atrás dela até alcançá-la, e, quando a alcancei derrubei-a no chão...

Nisso, o sujeito parou de falar e começou a respirar de forma ofegante. O que causou-lhe um certo receio, pois parecia que o homem estaria entrando em desespero, tendo um ataque, uma crise de asma.

- Francisco? Você está bem? Francisco? Procure se acalmar, aqui dentro é seguro.
- Desculpe doutor, mas é que quando começo a lembrar, me chega a dar um calor, uma coisa louca, tenho a sensação de que vou perder a consciência.
- Bom, se o senhor quiser continuar a falar amanhã...
- É acho melhor terminar amanhã...
- Alguém viu o senhor no milharal?
- Não... acho que não. Quando entrei no carro e vim embora não havia ninguém ali, pelo menos eu não vi ninguém.
- Ok. O primeiro passo é você não ser preso em flagrante, pois você não tem certeza se alguém te viu, assim, ligue para sua mãe dando alguma desculpa que não passará a noite em sua casa.
- Pode deixar, doutor.
- Você tem outra roupa? Porque com essas que está vestindo despertaria muitas suspeitas, e isso não é bom. Ela está ensangüentada não está?
- Tenho outra roupa sim doutor, na verdade essa é minha roupa de ginástica, minha roupa de trabalho está dentro de minha mochila no carro. É sangue da mulher isso aqui...
- Perfeito, vá buscar sua mochila e troque-se aqui no banheiro. Depois, pegue essa roupa ensangüentada e queime-a em algum lugar afastado. Entendido?
- Sim senhor, já volto.

Desligou o gravador e enquanto o sujeito ia buscar sua mochila, ficou pensando no que poderia ter acontecido para que ele cometesse um crime. Achou muito estranha a sua reação no momento em que iria contar sobre o ato sexual e sobre o crime. Nisto, já começou a esboçar uma linha de defesa em sua cabeça.

- Bom doutor, estou pronto para partir...
- Muito bem, esteja aqui em meu escritório, amanhã às duas horas da tarde que terminaremos a consulta.
- Amanhã às duas. Muito obrigado doutor, muito obrigado mesmo...
- Até amanhã então...

E assim partiu o sujeito, agora mais calmo e mais arrumado.


*** CONTINUA ***

terça-feira, 4 de março de 2008

Salvador?

(Parte I)

Estava terminando mais uma petição a todo vapor em seu notebook, trabalhava incessantemente, quando bate à porta de seu escritório um sujeito esbaforido, descabelado, com alguns arranhões no rosto e algumas manchas vermelhas na camiseta amarela, que estava bem esgarçada.

- Pois não?!?!?
- O senhor é o Doutor Salvador?
- Sim, em que posso ajudá-lo?
- Por obséquio, poderia primeiramente me oferecer um copo d´água, pois estou exausto como o senhor mesmo pode reparar, e, necessito, urgentemente contratar os seus serviços.
- O copo d´água posso trazer, mas, me desculpe, não estou atendendo a esta hora, o escritório já fechou, apenas estou terminando um último trabalho e já estou indo para casa e...
- Doutor, necessito muito de sua ajuda, estou desesperado... muito desesperado, é um caso urgente... por favor não tenho como recorrer a mais ninguém senão o senhor!!!

Pensou um pouco, viu que o homem estava realmente desesperado, algo lhe dizia que deveria ouvir a história que teria para contar...

- Bom, um minuto que vou pegar a chave ok...

Dirigiu-se mesa, apanhou a chave, abriu a porta, levou o sujeito até sua sala pediu para que se sentasse, enquanto iria buscar o copo d´água.
Não estava acostumado a fazer isso para seus clientes, porque quem o fazia era Lucélia, sua secretária, mas, como já se passava da meia da noite, assim o fez, com um pouco de receio, uma vez que nunca tinha visto o sujeito na vida.
Entregou o copo ao homem que o bebeu como se tivesse acabado de chegar do Saara.

- Pois não senhor, em que posso ser útil?
- Doutor, acabo de cometer uma grande besteira... o senhor é criminalista né?
- Sim, advogado especializado na área criminal... Que besteira o senhor andou fazendo?

- Acabei de matar uma moça... foi... foi um ato impensado, eu... eu não queria, mas...ela me obrigou...olha o meu rosto doutor, foi ela quem fez isso (apontava o homem para todos os arranhões, quando começava a se exaltar)...
- Acalme-se por favor, aqui o senhor está em segurança. Vou-lhe trazer mais um copo d´água e fazer algumas perguntas, ok?
- Sim doutor, tudo bem.

Estava acostumado a lidar com criminosos e assassinos desde a época de faculdade (no escritório de prática jurídica da universidade) onde selecionava apenas as causas penais para estudar e defender. Achava o máximo esmiuçar a legislação em busca de brechas e falhas que pudessem ajudar seus clientes. Não só os colegas de classe, como seus professores, reconheciam-no como o melhor aluno de direito penal da faculdade.

Mais uma vez retornou com o copo e entregou ao homem.

- Primeiro, gostaria de saber seu nome...
- É Francisco da Costa Estrella...
- Bom, Francisco, quantos anos o senhor tem? É casado? Solteiro? Trabalha?

- Doutor, tenho 30 anos, sou solteiro, moro com a minha mãe, sou formado em engenharia civil e trabalho para algumas construtoras daqui da cidade, e algumas de outros estados... Doutor não se preocupe com dinheiro, tenho o suficiente e alguns bens também... eu quero contratar o senhor, porque sei que é o melhor na área...
- Calma Francisco, conversamos sobre os honorários depois, agora preciso saber o que me traz o senhor aqui... certo?
- Certo...
- Gostaria que o senhor me contasse como tudo aconteceu. O que o senhor estava fazendo; onde ocorreu o crime; quem era a moça; se o senhor a conhecia; de que forma o senhor a matou, entendeu? Preciso saber de todos os fatos pormenorizadamente.
- Entendi sim... bom...

*** CONTINUA ***